Novíssimos poetas brasileiros
……..HÁ FÚRIA NAS PALAVRAS: NOVÍSSIMOS POETAS BRASILEIROS
………………. ……(Organização: Claudio Daniel)
Os poemas reunidos nesta breve antologia – Há fúria nas palavras: novíssimos poetas brasileiros – surgiram da experiência do Laboratório de Criação Poética, curso teórico e prático ministrado à distância por mim, via internet (Skype), onde são discutidos conceitos teóricos sobre a natureza da poesia, o processo criativo, os gêneros poéticos, entre outras questões, além da discussão dos textos escritos pelos alunos. O resultado prático deste curso, como os leitores poderão notar na apreciação do conjunto de composições que apresentamos aqui, está longe de ser epigonal: estamos diante de autores que pesquisam, afirmam vozes pessoais nítidas e trilham caminhos criativos próprios. Não são “alunos de poesia”, embora estudem: são poetas que merecem ser lidos e considerados individualmente pela qualidade de seus textos. O máximo que um professor pode fazer, num curso de criação literária, além de compartilhar informações, é estimular os seus alunos, apontando os seus pontos fortes, aquilo que eles já trazem como indícios de uma voz pessoal, indicar o que ainda necessita ser melhorado e apresentar desafios, como incentivos à jornada de constante superação. Neste processo, o aprendizado não é apenas dos alunos, mas também do professor, que descobre as suas próprias limitações e enriquece a sua experiência pessoal ao buscar conteúdos, algumas vezes novos para ele também, que serão apresentados à classe. Podemos considerar a oficina poética como uma obra em progresso, cujos resultados são, por vezes, surpreendentes. Uma prova disso é a presente antologia, que reúne poemas de catorze autores que participam do Laboratório de Criação Poética e que já o transcendem. Para mim, é um privilégio aprender com eles.
EDELSON NAGUES
PERCURSO
O viver, por si,
já se faz denúncia:
uma posse indébita.
Mundos anoréxicos,
riscos de carvão:
retina em eclipse.
Passos mortibêbados
no restolho incólume:
vulcão apascentado.
Ser em derrocada,
o futuro é ponto
que já não se conta.
À vista da foz,
retoma a tortura
do primeiro sopro.
Mas não há remorso,
ira ou cataclismos
– apenas cansaço.
Como um cão doente
que perdesse o senso
dos seus movimentos.
DU/ELO
O metal
rompe as fibras
do corpo
……..do outro.
O ato
perpetua o vínculo
…….entre
matador
……..& morto.
A vida
feita irmã
da morte.
Edelson Nagues é natural de Rondonópolis/MT e radicado em Brasília/DF. Poeta, escritor, revisor de textos e servidor público, ganhou vários prêmios em concursos literários nacionais e tem contos, poemas, resenhas e artigos publicados em antologias impressas e em diversos portais da internet, tais como: Revista Zunái, Revista Samizdat, Cultura alternativa, Revista Biografia, Recantos da Letras, Poetas S/A e Revista ContempoArtes, entre outros. Publicou, pela Editora Scortecci, os livros Humanos, de contos, e Águas de clausura, de poesia (vencedor do X Prêmio Literário Livraria Asabeça). É coautor do CD ANAND RAO, no CD “ANAND RAO musica poemas de EDELSON NAGUES” e organizador da coletânea Respeitável público: histórias de circo e outras tragédias (Editora Penalux).
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MARCELA CIVIDANES GALLIC
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NUVENS SUSPENSAS
Nuvens suspensas
Entrecorte de raios
Secas, as folhas
Dançam disformes
Caem e repousam
Na boca úmida do chão
ESTRANGEIRA
Seu caos me transforma corpo adentro;
ouço os gritos do meu silêncio,
reinvento todos os caminhos
e sigo, inesgotavelmente,
lua que acolhe todos os ventos.
Inunda-me incandescente,
sou estrangeira em meu próprio mar
— à beira dos sentidos, de um só sentido.
Marcela Cividanes Gallic nasceu em Sāo Paulo, formou-se em Direito pela FMU (SP) e é mestre em Direito Comparado pela CWSL (San Diego, CA). Exerceu advocacia nas áreas de contratos e atualmente atua como empresária na área de moda. É poeta, compositora e praticante de escalada esportiva. Tem poemas publicados em blogs, antologias poéticas e em revistas eletrônicas.
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CAIO GRACO MAIA
Comício
— provê quartos para as gentes, deputado; semirréptil, o deputado cobra. Lá vem ele um minuto adentro, contando o limo do bolsinho. Está verde de vontade. Acompanha o senhor na rua, na capela: está quase. Chama a cidade para dentro e marca tempo no relógio. — Que ideia, que profeta, diz um convidado. Todos riem, não o deputado, que passa o chapéu a solver o imbróglio: — é muito custo minha moçada, e estou falido, é notório. Mas não há vergonha, todos se divertem. Sabem que o velho trama tudo, tudo, e há de ser um belo espetáculo. Alguém propõe deitá-lo: — é assim mais visual, mas bem aparentado. — Olha o olhinho, olha. Sem dúvida, nada fraco. A boca expande, o corpo prova. Atentos todos: é hora! Da garganta, um passarinho, pardo penado todo, dá um voo e vai embora. — Que macaquice desse velho, que bela marmelada! — Acalma gente, sem discórdia. O próximo que aqui morar, prometo, há de pegar a terçã plasmódia.
Ló
Das amarras do emprego quis tentar um sal cozido, a ver que fosse — e assim disseram — atenuada sua aresta. Foi de todo comprimindo a pasta, a passos largos que chegasse em pedra. Em peça: o níquel, na verdade o seu timbre. O braço, na verdade a sua guelra. Tivesse anos sua mão contábil para o lábio conduzia aquela terra. Tivesse grana e mulher ainda mais se lhe iluminava a senda. Parou por ter fazendas de seu nome e das filhas o quarto arado. E pensando haver um deus morto de que profeta, reergueu-o para que o lugar do morto deus lhe fosse dado. Porque tal massa igual fogo empresta em dizer é a morte que atenua vossa aresta. A morte desta. Comuta um dito pelas ruas de Sodoma. E se o ruído e a lei colidem palavra e forma, ele emborca o vício sobre o pote da vergonha, até que em suas filhas tão somente se isso meça: a queda, fole emprenhando fogo em pedra.
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Caio Graco Maia nasceu em Salvador e atualmente vive em Aracaju. É graduando em Filosofia pela Universidade Federal de Sergipe.
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IOLANDA COSTA
BRASIL
as rãs de teu nome não saltam:
coaxam como sapos, anãs
coaxam como rãs
a fêmea muda que não coaxa
a língua longa que não alcança
o acento o inseto o insulto.
temem o enxame
o brejo em brasa
o andar de cócoras
e dormem, úmidas
no interior das bromélias.
VERBO ENCARNADO
Teu salmo de mil escárnios
ruiu. Não vês?
Deus esteve aqui e a mulher
antífona de ti
e de teus dizeres
anteviu o discurso
a boca delivrando, cheia de amor
e escarpas. Não ririas.
– Carne viva chaga exposta.
Seu sexo arrancado do meio das pernas.
Iolanda Costa (Itabuna-BA), graduada em Filosofia, é arte-educadora e especialista em História Regional. Editou, artesanalmente, folhetos de poesia Às Canhas as Palavras Realizam Mil Façanhas (1990), A Óleo e Brasa (19991) e Antese (1993). Tem poemas editados em jornais, antologias e blogs.Participou do Livro da Tribo (2013). É autora de Cinema: Sedução, Lazer e Entretenimento no Cotidiano Itabunense (2000), Poemas Sem Nenhum Cuidado (2004), Amarelo Por Dentro (2009), Filosofia Líquida (2012) e Colar de Absinto, no prelo. Coordena a Coleção de plaquetes Pedra Palavra (2012 -2017).
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SÁVIO DE ARAÚJO
a tua carne
entre os dentes dos meus ossos
semente e fronteira
há fúria nas palavras
náufragos incontornáveis
fuga cheiro água sal
onde viemos parar?
o que de tão impensado nos comete?
o urro dos bugios
tem a força da lança
que irriga feridas
nenhum punhado de vestígios
será motivo suficiente:
covardias indevassáveis
a língua do subterrâneo
emerge no fruto violado
comeremos
comeremos até que se possa fazer
a saúde dos corpos
disso
rituais probabilísticos
multiplicados ao indefinido
única ciência dos simulacros
‘
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tenho armas
e invento verdades
os extenso atalhos do acaso
nome destino
na revoada dos grumios
gritam os cantos de parede
nunca venha tão perto
deuses comem certo
homens pelas beiradas
demônios erram por vontade
ao nome daqueles cantos
Sávio de Araújo é poeta, músico e psicólogo. Nasceu na cidade de Macaé/RJ em 1992. Trabalha com Arte desde os 14 anos, participando de diversos projetos artísticos e acadêmicos.
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KÁTIA MARCHESE
CALEIDOSCÓPIO
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Fragmento som.
Partida em azuis
nego lágrima e cruz.
Abandono nome.
O medo serro
nos dentes de um rato.
Decomponho mito.
Casa, colchão e gozo,
traição compartilhada.
Estilhaço memória.
Ao nada devoto vida,
o estático germina.
A vida roda o mosaico:
azul compondo espaços
nos meus olhos música.
DIA A DIA
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Mastigou os girassóis
restava a última agonia
do desbotamento de um poema.
Ficaria a sós
com seus ossos e cabelos,
compreender articulações
empresta fios ao movimento.
A poltrona escolhe o sol.
Até que a carne termine seus preenchimentos,
calça um sapato negro
e ensina luto aos pés pequenos.
Katia Marchese nasceu em Santos, é gestora pública municipal e leitora ávida de poesia desde os 15 anos. Participou de cursos literários no SESC, Casa das Rosas, Espaço Barco, CPFL. Poemas publicados em 03 Antologias: Fragmentos Poéticos – Poetas Virtuais em 2002, Antologia Poetrix – Brasil-Portugal- E.U.A. em 2004, Antologia Poética Senhoras Obcenas em 2016 – Benfa. Poemas publicados na revista literária Zunai em dez/2016.
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GUILHERME DELGADO
VI
A fala é falo
afiado
trespassa a fenda
do grito
ampara o silêncio
tesado
faz filtro de ruídos
rimados
tem raiva mas ri
se relaxa
desembaraça
o pelo-novelo
quebra o gelo
calado
e ainda hoje
tem o seu apelo
preservado
pois haja o que
houver
ver é ágil
.
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VII
Falo quando olho
olho no olho
e ali vejo
em sua
hora nua
a alma sorver
o sal da língua
numa praia da ilha
líquida e turva. Assim
como agora ninguém
fala e a ágora agora
cala e um ciclope
feliz fura outro
olho cego
e goza
…………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………
ufa!
Guilherme Delgado é natural de João Pessoa (PB), onde reside. É bacharelando de Tradução (Inglês) na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e coeditor da revista independente Malembe.
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MARIA MARTA NARDI
VISCERAL
Nem tudo foi seco
e insano,
cru ou duro
A geografia incerta
que verteu vertigens
ao que em peso e medida
existia
E as cinzas arrancadas
do que indigesto
ardia
Desentranhadas as pedras
(armação flexível)
brotaram, entre as quebras,
bromélias e branduras.
POECOSE
Procuro uma súmula
Entre a loucura e a poesia
Uma sílaba
Que capte as evoluções
Desse delírio obsessivo
Cristais se infiltram
pelos olhos
Expandem a retina
Confusão de sentidos
Tropeço de verso
Mergulho
Em açúcar e clorofila
Verde que incide
Nos contornos da sua
boca
Elixir que não destilo
Hábito antigo
Esse seu hálito
de absinto.
Maria Marta Nardi, formada em Letras pela PUCC/UNIMAR, professora de Língua Portuguesa e apaixonada por poesia. Nascida em Marília/SP, reside atualmente em Rio Brilhante/MS.
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GUSTAVO VENDRAME
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A TURBA URBANA
a turba urbana se distrai dá trela às estrelas e estranhos às entranhas que lhes preenchem o ventre as espremem nas frestas entre pessoas nas festas e amortecem seus paladares em bares ou antes em restaurantes se empanturram e pagam e saem pelas ruas nos caminhos de suas guildas ou grutas numa turbulência dos ritmos de algoritmos que descrevem como reagem os indivíduos aos estímulos contínuos de consumo em suma seus rumos sobre o tabuleiro mundo
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RESINA
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este tronco
suporte de copas opacas
que fazem sombra aos serafins
será amanhã não frondoso
mas gostoso pasto de cupins
carcomido como se nele houvesse uma frieira
desafinando no centro de um éden jardim
é longo o seu declínio
e com fleuma ele se resigna
Gustavo Vendrame, 19 de agosto de 1993, natural de Medianeira-PR, graduando em Letras na Universidade Estadual do Oeste do Paraná.
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MARI QUARENTEI
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ARTE DE INSTRUÇÃO # ?
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o que?
um olho não pode ver ou mostrar isso
um olho-corpo pode captar ser possuído
se não sabe o que está fazendo
como continuar?
o que escreve? um pouco desenho
prazer que ficou atrás
“expressão é bobagem”
burrice
os rupestres
…tudo, vem da força do expressar/-se
têm tanto medo !
: risco-íris.
às vezes,
o papel parece um tecido amassado e aliso-o
não é mais virgem e belo
(como o anterior)
não é mais velho e belo
como se, eu não quisesse
aniquilar mais ninguém
.
querer pintar e me vêm
ventanias rosários
irá desprezar
faz parte dos que des-prezam,
depois de tudo
anda por uma meia
a m a r e l i n h a_ a
agora
/vivo no papel
para isso tem que agüentar imundice
desprimor / despudor
como 3 corpos nus
falta amanhã
assombro, ok?
armar a noite
não enxergar
nunca saber o que faz
odiar
não precisar olhar
cega ver os vazios
a falta de graça
o texto opaco
.
nada pode entrar aí
faz tudo “bonitinho” e tem vida “fácil”
não sei?!
tocar o amor
não ser seu bibelô
ocultar o inverno / não dizer nada
onde os limites?
in-perfeito
o que escreve abomina o céu
ou como tudo se torna híbrido e branco
não tem idéia: não é _socrático
não carrego palavra
com tanta fome
farta de beleza
MEDUSA
.
palavra
luta
é …solidão
…..sombra
……..fulgor
.
palavra morde
………arde exala
………….cintila
………oculta trái
…………….acorda
palavra cala
despe
acalma
invade
……..viola
.
palavra amarga
……..encanta
………deserta
palavra venta caí
.
…………..falha fracassa
.
palavra expira
……………indaga
………..sente pulsa
deita
atrasa
ri
devora
.
O que essa menina está dizendo?
O que essa menina está dizendo!
não entendo,
não entendo essa menina
palavra dói
……….cansa estraga
……….vaza inunda
.
…………excede
.
palavra urge falta desatina
.
palavra entranha
exubera exila
entorpece encarna
ceifa
cega
.
o tumor parece indizível
palavra coagula
.
sonha
devasta
.
_exausta
.
nega açoita resiste
chora foge arde grita
.
o parto é perto de Dionísio
.
palavra ferida
……………cura
……………canta
sacrifica afaga
.
secreta ama goza
palavra vaga
queima
espreita
.
é difícil
é éter
.
tanta palavra… sangra
.
palavra profana sagra
.
livre: medusa amálgama rito
Mari Quarentei, libriana nascida na cidade de São Paulo-SP e formada como terapeuta ocupacional, implicou-se desde os anos 80 com a desconstrução dos manicômios e a criação de dispositivos híbridos entre clínica, vida e arte. Atualmente vive em Botucatu-SP. Em 2010, retoma as artes visuais e a escrita a partir do contato com a cena artística de Curitiba, onde participa da criação do Marianas, coletivo feminista de escritoras e no SOMA atelier-galeria, com trabalhos e performances. “Correm Rios…- 2016 é seu primeiro livro, pelo Selo Edições Marianas. Tem poemas publicados na Antologia “Blasfêmeas: mulheres de palavra” (2016) e nas revistas e blogs: Mallarmagens, O RelevO, Totem e Pagu, Garibaldi entre outros. Pós-graduanda em Poéticas Visuais – UNESPAR.
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BRUNO GAUDÊNCIO
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PALAFITAS DO MEDO (OU QUANDO UM POETA COME A CIDADE)
Para Miró
Miró vende a cidade a preço de poema
engata um verso no esgoto da liberdade
enfrenta um cheiro de rio com a violência
e parte com os lençóis da praia
uma estrofe limpa de espermas.
carnaval no canto do olho
no vidro do ônibus partido
na esquina do mau cheiro
na angústia do oprimido
que de tão preto e pobre
desenha as palafitas no medo.
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DESTITUÍDO
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desgovernado
abro um
impeachment de mim,
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verdade boa
seria
não temer
homens partidos,
a direita ou a esquerda
[do ser].
Bruno Gaudêncio é natural de Campina Grande – PB (1985), ― escritor, jornalista cultural, historiador e professor, é formado em Jornalismo e História pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Mestre em História pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e Doutorando em História pela Universidade de São Paulo (USP). Publicou ao todo doze livros dos mais diversos gêneros, entre coletâneas de poemas e contos, antologias, ensaios e roteiros biográficos em quadrinhos.
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MÁRCIA TIGANI
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ESBOÇO
Vocês estão todos mortos: ossos
sombras
sentidos
Engrenagens que o vento ressecou
Olhos que o tempo só recicla
Como velhos papéis rasgados
Banalidades inscritas na fresta
Tonalidades que o vento não decifra
Meras construções de pedra.
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CANTO ANÔNIMO
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Não é teu o céu pintado
à guache, lápis-lázuli
a iluminar oásis
de cáctus e marfim.
Nem é tua a labareda,
a história dessa guerra
coração fincado à terra
e à argila carmesim.
Tua é a planície e o sal
o granito ,a ovelha atônita
a mulher e a voz afônica
de tanto chorar sem fim
Pelos filhos e seus espectros
plasmados a esmo e gesso
em momento de recesso
sob tônica e sob gim.
Não é tua a terra própria
nem a vida, nem a morte
Em tuas mãos há lama e corte
E teu nome é Serafim.
Terá fim esse cansaço?
Ou o fim deste mormaço?
Haverá fim o anonimato
a perseguir Serafim?
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Marcia Tigani, natural de São Paulo(SP), é médica , psiquiatra e divide-se entre o exercício da medicina e o prazer de escrever.Possui diversos poemas em antologias pelo Brasil e livros de poemas lançados na Bienal de São Paulo: “Caminhante: prosas e rimas ao vento”(Editora Somar_2012) e “Navegações e paragens”(Editora Tachion_2014).
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MÁRCIA FRIGGI
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Rosa incendiada
Ao sol do meio dia
E eu à flor da pétala.
* * *
Sol de dezembro
nasce a gema dourada e
tudo amarelece.
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* * *
PEQUENAS CONFUSÕES
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Um haicai tão antigo
que dá flores e frutas
lindos versos em bonsai.
* * *
Chuva de verão
O vento lambe o vale
Lava as veias do rio.
* * *
Terror de Natal
Dormem anjos sírios em
Presépios bomba
Marcia Friggi nasceu em Mata (RS). Especialista em Linguística, graduada em Letras pela UNICRUZ- Cruz Alta, RS. Professora de Língua Portuguesa e Literatura do Estado de Santa Catarina. Reside em Indaial- SC. Participa desde 1999 da Associação Artística e Literária ALPAS XXI como acadêmica fundadora, com diversas publicações em suas coletâneas.
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YARA DARIN
MOSAICO
Corpos estremecem
espelhos convexos
ritmo perverso,
te encalço
ranhura de luz
bocas que passeiam
dedos deslizam
é instinto,
labirinto dos corpos
nirvana, sonho de gozo
fogoso sem pejo
pétalas de um tempo infindo
corpo em outro corpo
vital é o amor
tudo flui ao êxtase
grinalda, perfumada flor
como estrela da libertação
miríade sideral.
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RETRATO DE UM POVO
geração de chumbo
corpos de lama
oprimidos em cada célula
lâmina de foice
fios de faca afiados
chibata de sete nós
democracia do medo
olhar latifundiário
fortuito sabiá-do-campo
terra vermelha sovada
lavradores sem teto
útero fecundo à semente
estrelas da eternidade
aos olhos do camponês
tudo parece alegoria
pés carcomidos
cicatrizes que sangram
morrer é nada
o nada persiste.
Yara Darin nasceu em Marília (SP). Poeta e escritora, formou-se pela FMU e pela Escola Panamericana de Arte e Design. Escreve nos blogues Família em dia e Amanhecer…onde tudo recomeça. Atuou por vários anos na revista literária eletrônica “Varal do Brasil com Sede em Genebra/ Suíça. Participou de saraus e recitais. Tem contos e poesias publicados no Varal Antológico 2 e 4. E-mail: yaradarin2902@gmail.com
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