Diálogo entre poetas
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– Que tal um diálogo?
– Sobre poesia? Topo. Desde que tendendo para o sumário e sem dó de peito.
– Mas vale sentimento?
– Desde que seja o da pequena harpista loura que diz para a audiência: observem este morceau. Vou tocá-lo sem sentimento; e, em seguida, com sentimento. O que faz. Ninguém nota a diferença.
– E ideias?
– Desde que agachadas; no contra-pé de Valéry.
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– (… quem escolhe, para epígrafe de seu poema Le cimitière marin, este verso de Píndaro: “Oh minha alma, não aspires à vida imortal, mas esgota o campo do possível,”).
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– Octavio Paz dizia haver muitas maneiras de se dizer a mesma coisa em prosa e só uma em poesia.
– Verdade. E o melhor de tudo é que se é poeta o que pega uma dessas muitas maneiras da prosa, ele faz com que ela vire a maneira única da poesia.
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– Confrade nosso andando pela Pérsia, lá ouviu o caso de uma velhinha que, vítima de um terremoto, passara alguns dias sob os escombros. Ao ser resgatada quase sem vida, a primeira coisa que fez foi recitar um poema da tradição persa que falava sobre a maravilha de estar vivo. Lembrei-me da historinha ao final de uma oficina de criação que ministrava e ao relatá-la não é que desandei a chorar, assustando as pessoas? Que poder tem a poesia, hein?
– Verdade. Mas veja também o poder nenhum que a poesia também tem. Dois artistas jovens em período de formação, de famílias abonadas, foram para Paris para aprender e viver e se hospedaram num hotelzinho qualquer daqueles da rive gauche. Donos do pedaço, não perdiam ocasião para manifestar aos hóspedes e empregados a condição de pintor de um e de poeta do outro, sob o olhar da velhota que conduzia a recepção. Um dia esta pega de lado o jovem poeta e pergunta:
– Você é poeta? Sou, retruca o vate, já esperando o cumprimento.
– Pois se há uma coisa que eu deteste nesta vida é a poesia.

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