Por extensão de sentido
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a propósito de zéfiro
mais precisa que outras de própria carne
tua tempestade veio dar em mim,
extenso braço de terra entre correntes
impronunciáveis
segundo a desordem guardo das tormentas
sequer o ruído após às sobras do corpo
esse, para quem o chão não há suspenso
agravo a possibilidade da calma
receio o cerne daquela tempestade
avolumando-se em esfumaço sem
auxílio do vento ou toda agitação
ocupando desde o fim o continente
.
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***
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não era anjo o menino
endiabrado da boa noite
trazia ânimo e tudo mais
isso fez por muito tempo
não lembro o que me foi depois
(eu bem queria vida inteira)
mas lembro dele
só
na solidão da noite
tão bem composta
que quase o fazia em mim
nesse desejo
lembro também dos versos estremecidos
mimos
e de uma saudade
bem mais que tudo
só
tua
.
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A escolha de Cecília
Nenhuma vontade lhe parecia válida
ou suficiente.
Gastava, no uso repetido, os dias velhos
e se desgastava neles.
Desgostava, deles, a ausência de serventia.
A tal ponto sem vontade,
sem pressa e sem demora,
Cecília esvaziava-se de si,
de sua lucidez cansada.
Correram alguns a dizer que morreu por escolha,
embalada ao ânimo que lhe faltava em vida.
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Conveniência e rumor de impulso
Entre o fim e o vão de uma ideia
esse intervalo
pedaço de omitir-se
polpa e circunspecção
Se eventualmente pudesse desfigurá-lo
de forma nítida
suspenderia o excesso de luz
que me esconde aos extremos
Redefino o traçado
limite oposto
sobre a imagem de um caixilho
recuperado aos escombros do éter
Sem menos escora
sustento fachadas, ruídos
Em evidente descaso
ao cenário
a poeira germina por costume
não o das tradições valiosas incálidas
mas o do descontínuo sem-cuidado
com que se atrelam
(vagoam-se) um após outro
o mesmo dia
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indicações estruturais
à dicção das tormentas
irrupções anunciam suas fraturas
no subterrâneo em busca do próprio
encalço
o frontispício rasteja olhares
paralelo de horizonte inanimado
suponho que em suas reflexões
não haja pausa
o movimento não cessa
de reiterar-se
repete e inaugura a claridade
.
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outro ponto de inferência
alcanço de qual palavra
nada mais daquilo que lhe era fixo
em todo caso serve
parábola de alguma forma sem pressa
desfigura-se
geometrismo aquilatado
que o sino estoca
de hora em hora pequena
para outra soma
que nesse trato sem medida atordoa
.
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linha do tempo
é quando me alcança esse abandono
que o mundo principia
amanhã, tão logo o reescreva
talvez alguém se detenha
na alternância das Idades
provavelmente
à sobra do aproveitamento
e provavelmente também
com a mesma gravidade cotidiana
na qual o sol a chave o fundo manto
no futuro do inverso
nem suspeitem do que lhes devam
os fonemas
nomes apenas de escora
entre outros fenômenos sem conta
.
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Por extensão de sentido
Escondo no escuro o percurso do corpo
ainda que a treva
mais se atreva à evidência do realce.
Aquilho acentuar a forma da palavra
e trato de observar a noite
em seu movimento grave;
nela, tudo equivale ao que o dia repete
em sua acústica claridade.
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disposição ao risco
parte do dano
invento
já no que insiste oculto
e reparte em todo fragmento
parte desse mesmo
ponto
o que vejo por destroço
e de agora em diante não
mais aguardo
em seguida o trecho (de fuga ou bocado)
busca outro evento
e se parte em um pedaço
.
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Dado em vantagens
Exposta em cada plano
uma mesma objeção
talha a noite das gentes
e causa mais agravo
Sempre muita razão
a esta insuficiente
queda eleva os sentidos
Reunidos às centenas
números sem divisa
amontoam-se em guarda
firmes
sob nenhuma forma fixa
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Sobre a poesia de Denise: http://poesia-pau.blogspot.com/2011/12/onde-nao-ha-facilidade.html
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Denise Freitas, nasceu em Rio Grande (RS). Escritora e professora de história. É autora de Misturando Memórias (2007), Mares inversos (2010). Escreve no blog: www.sisifosemperdas.blogspot.com E-mail: denise demfreitas@gmail.com
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