A eternidade dos dias
Orelha do livro A eternidade dos dias, de Luiz Otávio Oliani
Com A eternidade dos dias, Luiz Otávio Oliani compara o processo de escritura à própria existência se fazendo eterna. No poema que fecha o livro, o autor nos conduz ao vazio que o eterno nos mostra, não podendo, portanto, ser medido pela lógica racional. A “eterna imaginação” das palavras nos leva à força do imaginário que é eterno como uma “orquestra”, elevando-nos pelo ritmo e pela música. Seus versos secos, como descreve sua poesia, “não deixa rastros”, pois não tem enfeites ou coloridos artificiais. O poeta, qual “operário” faz seus versos com precisão, construindo o espaço da liberdade a partir de “palavras rebeldes” que não se deixam conter pelo excesso. A linguagem é de contenção e não de excesso, mas o seu contido se afoga no abismo, no eterno e no vazio do sem-limite da expressão poética. Sem “lágrimas” e sem “águas” que “lavam o poeta” seu estilo seco e contido é de uma riqueza extraordinária. Em Epitáfio, “o verbo contido” traduz o máximo a partir do mínimo que a experiência da morte expressa, pois a contenção é sua reserva de poetar. O espaço do sagrado também se faz presente, alimentando como hóstia seus seguidores: “o poema também alimenta”. Neste livro, o domínio da escritura ultrapassa a própria dimensão do sagrado, pois “o poeta escreve” enquanto “Deus se cansa de acariciar o vento”. Portanto, sua poesia, ao mesmo tempo livre e contida, cria um paradoxo rico que vai deixar marcas para as gerações futuras.
Alexandra Vieira de Almeida [Doutora em Literatura Comparada (UERJ)]
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Poemas do livro A Eternidade os Dias, Editora Miltifoco, RJ, 2012
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ENCANTAMENTO
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no balde de juçaras
o homem busca
a água de que precisa
no terreno seco
procura o vento
encontra Deus
disfarçado de sabiá
DESATINO
dentro de mim
uma caixa de sapatos
meia dúzia de pipas
um gibi
meu pai virou rio
deixou inventário
o que ficou
além da herança?
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CONSTRUÇÃO
A Lara de Lemos
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a palavra é adaga
a cortar os pulsos
contra ela
milícias bombas
são inúteis
canhões não têm vez
sequer mordaças
a palavra não se cala
grita ejacula goza
a palavra é adaga
fere, mata
mas também é espera:
seu tempo é todo o tempo
O POETA E O OPERÁRIO
A Maiakóvski
o que difere
o poeta do operário?
na maquinaria
o trabalho braçal
dá lugar à escolha
de substantivos
verbos
metáforas
se um carrega cimento
terra areia
o outro esculpe o ser
talha a essência
se um usa espaçador de piso
espátula roldana
o outro opera em silêncio
na construção do poema
SEMEADURA
“Já a poesia não se dá, como flor.
Escrever se faz difícil
passagem em caverna estreita.”
Lucia Fonseca
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o vazio
dá espaço à escuridão
olhos percorrem
o silêncio da caverna
em busca de letras
no signo de metáforas
as mãos ouvem as flores
Deus se cansa
de acariciar o vento
o resultado?
o poeta escreve
EM NÓS
o que há em nós
é a espera
que não finda
o que há em nós
é o desejo
de ver no outro
o que nos falta
o que há em nós
é a espera do porvir
que nunca chega
o que há em nós
é a fome
que não sacia
ESBOÇO SOCIAL
“Os fantasmas têm que existir”
Adalberto Marques
fantasmas
habitam pessoas
cegas surdas mancas
não ouvem a fome alheia
não tateiam a dor dos miseráveis
não enxergam o coração dos desvalidos
a sociedade se compadece
de ter e não de ser
defeca arrogância
ri de si mesma
se julga superior
esquece que
os espelhos
ainda existem
Luiz Otávio Oliani nasceu no Rio de Janeiro. É graduado em Letras e Direito. Como poeta, tem presença marcante no movimento poético carioca a partir da década de 90. Em maio de 2000, foi homenageado com a medalha “Só para Lembrar” no recital “Versos Noturnos” organizado pela SPOC. É detentor de mais de 50 prêmios literários. Consta em mais de 53 antologias de literatura e em mais 300 publicações entre jornais, revistas e alternativos. Publicou dois livros pela Editora da Palavra: “Fora de órbita”, 2007; recomendado pelo Jornal de Letras, em outubro de 2007 e citado com destaque no texto “O ano literário de 2007”, por André Seffrin, na Revista Literária da Academia Brasileira de Letras nº 56; “Espiral”, 2009; citado como destaque em “O ano literário de 2009, o segundo semestre” publicado Revista Literária da Academia Brasileira de Letras nº 62 e na Revista dEsEnrEdoS e “A Eternidade dos Dias”, Editora Multifoco, 2012. Em 2011, foi citado como poeta contemporâneo por Carlos Nejar no livro “História da Literatura Brasileira, da Carta de Caminha aos contemporâneos”, SP, Leya, p.1003, e em “33 motivos para um crítico amar a poesia hoje”, obra de Igor Fagundes, Editora Multifoco, RJ. Recebeu Moção de Louvor e Reconhecimento da Câmara Municipal Rio de Janeiro, em novembro de 2011. E-mail: oliani528@uol.com.br
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