Cultivando o Espírito Humano
A cultura possui vários matizes e inúmeras foram as formas de abordá-la com o correr do relógio histórico. Sabemos que, no Ocidente, a palavra e o conceito que ela abraça originaram-se, etimologicamente, de uma metáfora agrícola: “cultivar o solo”. O conceito irradiou-se às ideias, às práticas sociais e suas heranças, ao conjunto de padrões de comportamento, de crenças, conhecimentos, costumes e tudo que possa vir a distinguir uma pessoa ou um grupo social.
Na década de 1930, o educador japonês Tsunesaburo Makiguchi cunhou o neologismo “Soka” – originado da aglutinação das palavras “criação” (sozo, em jap.) e “valor” (kachi, em jap.). O termo, além de ser a essência de sua revolucionária pedagogia, tornou-se o pilar e o modus operandi desta esplêndida organização humanista que é a Soka Gakkai Internacional. A Paz, Cultura e Educação para gerar valor são os componentes do tripé que sustenta a atuação dessa organização e suas afiliadas em192 países e territórios.
Da educação e da geração de valor brotou o que pode ser chamado de Cultura Soka que, aliada à Educação Soka, é uma ferramenta essencial para a transformação positiva do ser humano e da sociedade. Em outras palavras, cultivar o espírito humano para gerar valor e estabelecer a paz.
“A paz e a cultura são uma só.” Com essa afirmação, o presidente da SGI, Daisaku Ikeda, sintetizou qual seria o objetivo final da cultura. Ele complementa:
“Uma nação verdadeiramente culta é pacífica, e vice-versa. Quando os conflitos se multiplicam, a cultura declina e as nações caem numa existência abominável. A história da raça humana é uma luta entre a cultura e a barbárie. Depois de deixarmos as tensões da Guerra Fria para trás, a questão premente passou a ser esta: ‘Como será o novo século?’ A cultura é a única força capaz de acabar com o conflito e estabelecer a paz.”[1]
Olhando nosso passado recente, podemos afirmar que a própria ideia de cultura precisa ser reavaliada. Essa necessidade premente torna ainda mais fundamental o olhar e a prática que a Cultura Soka instaura sobre o homem e a sociedade.
Ao comentar sobre as tendências culturais do século 20 e as comemorações referentes ao Dia da Cultura no Japão, em 1995, o filósofo pacifista Daisaku Ikeda foi firme em suas reflexões:
“Estamos diante de uma situação que não é simplesmente uma tendência recente ou uma condição passageira; é um problema fundamental de nosso tempo. Ou seja, se as pessoas são espiritualmente vazias, a cultura nada mais é do que um embelezamento, um entretenimento vazio. Pensem em Auschwitz, o campo de extermínio construído pelos nazistas. Os militares de Auschwitz cometeram diariamente terríveis atrocidades, embora dissessem gostar de Bach e Mozart e ler Goethe. A imagem de uma pessoa apertando o botão das câmaras de gás enquanto ouve Mozart — certamente esse cenário de pesadelo é um símbolo de como este século está doentio. Talvez esse assunto seja sério demais para se comemorar o Dia da Cultura, mas enquanto ignorarmos esse problema, discussões mais animadas sobre arte e cultura são insignificantes.”[2]
A cultura não pode se tornar simples erudição ou um mero acessório para camuflar nosso vazio espiritual. Ela é a própria força espiritual que direciona o ser humano à valorização da dignidade da vida e à realização efetiva da felicidade de toda a humanidade.
A humanidade anseia por uma cultura que tenha como base uma filosofia global e humanística. Intelectuais e pensadores do mundo inteiro, cada vez mais, reconhecem e simpatizam com os ideais propostos pela Soka Gakkai Internacional e cultivados por Daisaku Ikeda em suas ações, diálogos e reflexões.
Não nascemos prontos. Somos seres em construção e, justamente por isso, precisamos cultivar e criar valor, sempre que for possível, em nós mesmos e nos outros. Ikeda nos adverte: “Há um ditado que expressa que um ser humano é algo vivo que trabalha para se tornar humano. E esse é exatamente o significado de cultura – trabalhar para tornar-se humano. O nobre movimento da SGI objetiva fortalecer esse poder da cultura e por meio disso unir toda a humanidade.”[3]
É esse “poder da cultura”, essa força espiritual, que a Cultura Soka semeia nos campos ressequidos do coração humano.
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[1] IKEDA, Daisaku. Juventude: sonhos e esperanças, v. 1. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, p. 238-239.
[2] “A cultura é uma força espiritual”, discurso informal de Daisaku Ikeda publicado no jornal Brasil Seikyo – Edição 1309, p. 4, 25 fev 1995.
[3] Ibidem.
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Edson Cruz é escritor e editor do portal MUSA RARA (www.musarara.com.br). Graduado em Letras pela USP, publicou quatro livros de poesia, uma adaptação em prosa do clássico indiano Mahâbhârata e um livro de depoimentos sobre o que seria a Poesia. Seu livro Ilhéu (Editora Patuá) foi semifinalista do Prêmio Portugal Telecom 2014. Em 2016, publicou O canto verde das maritacas (Editora Patuá). É afiliado à Soka Gakkai Internacional desde 1993. E-mail: sonartes@gmail.com
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16 novembro, 2016 as 10:32