Para detestar Houellebecq
…………..Uma dúzia de razões para detestar Michel Houellebecq
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1- Houellebecq quer nos fazer crer que vivemos tempos difíceis, fraturados como nunca. Não há nada de verdadeiramente novo nos tempos atuais. Já estava em Shakespeare: “the time is out of joint”. Aliás, Borges notou que idealizar o passado, o futuro ou o presente são trapaças semelhantes.
2- Harold Bloom escreveu que estamos todos contidos em Shakespeare. Quis dizer com isso que à literatura não é dado eximir-se de referências à tradição precedente. Todo grande escritor mede-se edipianamente com um poeta anterior. Com quem briga Houellebecq quando vai do nada para a consagração?
3- Na pressa, Houllebecq já foi considerado “o Céline do Mac Donald”. Temo que a diferença entre Houllebecq e Céline seja a que vai do pintado para o sarapintado.
4- Numa das muitas entrevistas em que pratica seu gênio oral, Godard diferencia entre os diretores que fazem cinema e os que fazem filmes. A diferença entre uns e outros, segundo ele, é que os que fazem filmes só são cineastas por designação do mercado. A marcha dos lançamentos dos livros de Houellebecqu e o estardalhaço que acompanha o processo mostram que ele pertence à segunda categoria.
5- Falso bandido, Houellebecq tem um site oficial, com traduções para o inglês, o espanhol , o italiano, o alemão… e galeria de fotos.
6- A carta-convite de Liz Calder, organizadora da FLIP, aos autores selecionados para a Festa de Paraty fala num “evento animado em clima carnavalesco” (Folha de São Paulo, 06/07/11). Invertendo a mesma lógica, os editores de Houellebecq nos convidam para um animado carnaval de horrores.
7- Houllebecq vende bem, papa prêmios, causa comoção. Desconfie do atrabiliário milionário.
8- Consta da biografia de Portinari que o Duque de Windsor lhe perguntou, numa exposição internacional: “O Senhor não pinta flores?”. Portinari respondeu: “Flores não, só miséria”. A diferença entre Portinari e Houellebecq é que o primeiro morreu intoxicado pela próprias tintas.
9- Gilles Lapouge sobre Houllebecq, recentemente, no jornal O Estado de São Paulo: “Jamais havia me encontrado com o escritor. Cruzei com ele antes do lançamento do seu último livro, Soumission. Fui seduzido pela maneira com que falou dos cachorros, dos gatos, das mulas. E também por sua amabilidade e seu aspecto desmazelado. Foi um belo momento de poesia. Não deveria ter relido seus livros.”
10- Se você tem repertório e conhece o dark side da existência tal como retratado na grande arte, certamente, terá percebido que Houllebecq não é Goya.
11- A mídia francesa costuma chamar o estilo Houellebecq de “sulfuroso”. Pusilânime, o adjetivo diz tudo: um escritor metido a diabólico.
12- Dizia Borges que o equívoco da literatura contemporânea é a ênfase. Parece que adivinhava a chegada de Houellebecq.
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Leda Tenório da Motta estudou com Roland Barthes, Gérard Genette e Julia Kristeva. É Professora no Programa de Comunicação e Semiótica da PUC/SP, pesquisadora do CNPq nível 1, pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, tradutora e crítica literária, com passagem pelos mais importantes cadernos de cultura brasileiros. Traduziu, entre outros, O Spleen de Paris de Baudelaire e Métodos de Francis Ponge, o primeiro livro deste poeta a sair no Brasil. Publicou, entre outros, Proust – A violência sutil do riso, que recebeu o Prêmio Jabuti, e Roland Barthes- Uma biografia intelectual (Iluminuras), finalista do Prêmio Jabuti. Lança em 2015, pela Iluminuras, Barthes em Godard- Críticas suntuosas e imagens que machucam. E-mail: ltmotta@pucsp.br
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11 agosto, 2015 as 16:49