O (des)acordo ortográfico
Quem cravou essa expressão – “(des)acordo ortográfico” – foi o conhecido professor Pasquale Cipro Neto. E, agora, a presidente Dilma resolveu adiar para 2016 a oficialização da nova ortografia. Segundo Cipro Neto, o “(des)acordo ortográfico é um verdadeiro horror”. Penso que o acordo acertou numas coisas, errou em outras e conseguiu estabelecer confusões várias.
Acho bom acabar com o trema. Acho realista botar no alfabeto as letras k, w, y. Primeiro, porque tais letras não são mais estrangeiras, Segundo, porque grande parte da população inventou nomes exóticos para os filhos com y, w e k, como se estivessem recuperando o tupi guarani através do inglês. Mas é um equívoco não diferenciar o verbo “pára” da preposição “para”. Faz falta. E não faz sentido ter que escrever “antirreligioso” sem hífen, com os dois “rr”e botar hífen em “hiper-requintado.
Mas, além dessas minúcias, as falácias do acordo estão nos seus pressupostos. Vejamos:
1) “Melhorar o intercâmbio cultural entre os países em que se fala o português”.
Isto é falso. O intercâmbio cultural entre o Brasil e outros seis países de língua portuguesa existirá não por causa da presença/ausência de um trema, um hífen ou acento diferencial. O intercâmbio cultural só existirá se o Ministério da Cultura e o Itamaraty tiverem uma política cultural. Não têm. Vivem de expedientes, improvisações. Testemunhei isto de perto durante os seis anos em que dirigi a Fundação Biblioteca Nacional. Não há projetos, nem coordenação. Com todas as dificuldades, o pequenino Portugal faz mais pela divulgação de sua cultura do que nosso gigante adormecido.
2) “Reduzir o custo econômico da produção e tradução de livros”.
Outra falácia. As editoras gastaram fortunas reeditando livros na nova ortografia. As dificuldades linguísticas não acabam tirando ou botando acentos. As principais dificuldades da língua são naturais e não têm solução. São regionalidades inevitáveis. Cada língua cria seu vocabulário, sua semântica e até variações sintáticas. Se esse quesito fosse verdadeiro, Guimarães Rosa jamais seria lido em Portugal e África.
3) “Facilitar a difusão bibliográfica e das novas tecnologias”.
Isto é uma abstração. Primeiro, porque os acentos e hifens nunca atrapalharam o entendimento em português. Em segundo lugar, assim como o latim era a língua em que até recentemente os filósofos e cientistas se comunicavam, hoje o inglês é esse esperanto universal. Onde há pesquisa avançada criam-se termos novos, por isto a grande maioria das palavras importantes em tecnologia são em inglês. Nem o francês, nem o alemão podem concorrer com o inglês neste campo.
4) .“Aproximar as nações de língua portuguesa”.
Outro equívoco. Não é a ausência do hífen, do acento diferencial, do trema que vão nos redimir culturalmente. O que separa o Brasil dos demais países de língua portuguesa é a incúria brasileira. Nossas novelas de televisão, a música popular e a literatura que chegam a Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Timor Leste e Portugal não representam nem 10% do que se pode fazer ordenadamente. Aliás, os industriais, os exportadores, os comerciantes brasileiros que de instalaram na África e Ásia teriam muito que ensinar aos intelectuais. Tais empresários nem sabem o que é hífen e tremem ao usar o trema e, no entanto…
Enfim, estou apenas insinuando coisas que venho repetindo há décadas. Dei fartos exemplos disto no livro “Ler o Mundo” (Ed. Global). Participei de insanas reuniões em Brasília e no exterior. E há pouco tempo fiz, no Itamaraty, a convite do embaixador Jerônimo Moscardo, duas conferências para embaixadores latino-americanos e africanos. A primeira chamava-se “Brasil e América Latina: uma “plaza mayor”; e a segunda: “Brasil e África: fraturas geológicas e aproximações culturais”.
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O assunto é vasto. Precisamos mais de vontade política do que de vontade linguística.
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Affonso Romano de Sant’Anna: Um dia dizendo seus poemas no Festival Internacional de Poesia Pela Paz, na Coréia (2005), ou fazendo uma série de leituras de poemas no Chile, por ocasião do centenário de Neruda ( 2004), ou na Irlanda, no Festival Gerald Hopkins(1996), ou na Casa de Bertold Brecht, em Berlim(1994), outro dia no Encontro de Poetas de Língua Latina(1987), no México, ou presente num encontro de escritores latino-americanos em Israel(1986), ou participando o International Writing Program, em Iowa(1968), Affonso Romano de Sant’Anna tem reunido através de sua vida e obra, a ação à palavra . Nos anos 90 foi escolhido pela revista “Imprensa” um dos dez jornalistas que mais influenciam a opinião pública. Em 1973 organizou na PUC/RJ a EXPOESIA, que congregou 600 poetas desafiando a ditadura e abrindo espaço para a poesia marginal; foi assim quando em 1963, no início de sua vida literária, tornou-se um dos organizadores da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda, em Belo Horizonte. Com esse mesmo espírito de aglutinar e promover seus pares criou, em1991, a revista “Poesia Sempre” que divulgou nossa poesia no exterior e foi lançada tanto na Dinamarca, quanto em Paris, tanto em São Francisco quanto New York, incluindo também as principais capitais latino-americanas. Atento à inserção da poesia no cotidiano, produz poemas para rádio, televisão e jornais. Tendo vários poemas musicados (Fagner, Martinho da Vila), foi por essa e outras razões convidado a desfilar na Comissão de Frente da Mangueira na homenagem a Carlos Drummond de Andrade, em 1987. Apresentou-se falando seus poemas, em concerto, ao lado do violonista Turíbio Santos. Tem também quatro CDs de poemas: um gravado por Tônia Carrero, outro comparticipação especial de Paulo Autran, outro na sua voz editado pelo Instituto Moreira Salles e o mais recente outro pela Luzdacidade, com a participação de atrizes e escritoras. Seu CD de crônicas, tem participação especial de Paulo Autran. Escreveu dezenas de livros de ensaios e crônicas. Como cronista, aliás, substituiu Carlos Drummond de Andrade no “Jornal do Brasil” (1984). Blogue: http://affonsoromano.com.br/blog/index.php E-mail: santanna@novanet.com.br
4 fevereiro, 2013 as 12:17
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